Inep libera, em todas as edições, a versão digitalizada do texto entregue pelo candidato. Na edição mais recente, apenas 12 estudantes conseguiram a nota máxima na redação. Candidatos do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2024 já podem consultar os “espelhos” da redação — ou seja, as versões digitalizadas dos textos que eles entregaram no dia da prova. Para acessar o documento, é necessário entrar na Página do Participante, neste endereço.
Em 2024, os candidatos tiveram de escrever sobre:
“Desafios para a valorização da herança africana no Brasil”;
e “Desafios para a valorização da arte de periferia no cenário cultural brasileiro” (reaplicação da prova em dezembro, para pessoas privadas de liberdade e para quem teve algum problema previsto em edital na data original).
O g1 teve acesso a alguns dos 12 textos que obtiveram a nota máxima. Confira abaixo a íntegra dos conteúdos.
⚠️Observação: as transcrições abaixo foram fiéis aos textos dos alunos, incluindo possíveis erros de português.
✏️ Danilo Oliveira Batista, de São Luís (MA)
Redação nota mil de Danilo Oliveira Batista, no Enem 2024.
Reprodução.
O “ciclo do ouro” – ocorrido no Brasil no século XVIII – acarretou o aumento do número de escravos provenientes do continente africano no país, trazidos com graves diferenças culturais entre si, sem que fossem levados em consideração os aspectos regionais e sociais de suas origens, ocasionando uma homogeneização forçada de indivíduos. Atualmente, de forma análoga à História Colonial Brasileira, ainda há uma forte tendência à padronização cultural da África, desprezando sua pluralidade e seu legado. Assim, dois grandes desafios para a valorização da herança africana no Brasil devem ser debelados: as políticas públicas ineficazes e as falhas educacionais.
Diante do cenário exposto, as políticas públicas ineficazes possibilitam a desvalorização do legado africano no país, uma vez que elas impedem o estabelecimento concreto de uma revisão histórica pautada em mais oportunidades, proteção e visibilidade para pessoas pretas. Consoante o sociólogo Émile Durkheim, uma sociedade sem regras claras, sem valores e sem limites encontra-se em estado de anomia social. Nesse sentido sociológico, esse estado anômico pode ser observado na hodierna realidade brasileira, na medida em que as políticas públicas ineficientes permitem o desprezo e o desrespeito com as religiões de matriz africana, a desassistência em áreas quilombolas e a ausência de representatividade em propagandas, por exemplo. Com base nisso, uma mudança urgente e pragmática deve ser realizada, visando à transformação dessa conjuntura, de modo a não só valorizar a herança africana no país, como também a protegê-la.
Ademais, as falhas educacionais também constituem-se como importantes fatores que aprofundam o descaso com o legado africano no Brasil. Segundo o filósofo Inmanuel Kant, “o homem é aquilo que a educação faz dele”. Sob esse prisma filosófico, essas falhas educacionais solidificam mentalidades alienadas na população, potencializando preconceitos e ratificando equívocos concernentes à cultura africana no país. Nesse viés, a própria formação do cidadão brasileiro – no que tange à África e sua herança – é maculada por noções desprovidas de veracidade e etnocêntricas, corroborando a desvalorização da pluralidade e das “raízes africanas”, presentes em campos variados, como a gastronomia, a dança e a religião, representados respectivamente, pelo acarajé, pelo tambor de crioula e pelo candomblé. Então, torna-se imperiosa a correção imediata dessas falhas, no sentido de debelar erros e ampliar visões africanas positivas.
Infere-se, portanto, que as políticas públicas ineficazes e as falhas educacionais configuram-se como os dois desafios para a valorização da herança africana no Brasil. Nessa ótica, o Governo Federal – órgão máximo responsável pela ordem social – deve ampliar as políticas públicas existentes, tornando-as mais eficazes, por intermédio de uma aliança com o Governo Estadual e o Governo Municipal, com a finalidade de aumentar a proteção, as oportunidades e a representatividade das pessoas pretas. O Governo Federal também deve corrigir as falhas educacionais, por meio da Mídia — grande divulgadora de informações — e da Escola, a fim de mitigar equívocos, ocasionando a valorização do legado africano. Logo, o país possuíra uma estrutura melhor para “dialogar” com a herança da África, longe da padronização impositiva ocorrida durante o “ciclo do ouro” no século XVIII.
✏️ Sabrina Ayumi Alves, de Araçatuba (SP)
Redação nota mil de Sabrina Ayumi Alves, no Enem 2024.
Reprodução
O livro “Nós matamos o cão tinhoso” de Luís Bernardo Honwana retrata a sociedade moçambicana durante a colonização portuguesa. Na obra literária, observa-se uma dinâmica social pautada pela inferiorização dos indivíduos negros, na qual o racismo está enraizado nas interações entre as pessoas, na qualidade de vida e na autoimagem de cada ser. Assim, ao inserir a imagem criada pelo livro no contexto brasileiro de ínfima valorização da herança africana, infere-se que o passado colonial persiste nas estruturas do Brasil, se manifestando a partir do apagamento sistemático da cultura afro-brasileira. Em razão disso, deve-se discutir o papel do Estado no setor escolar e cultural diante desse contexto de silenciamento.
Em um primeiro momento, é necessário entender a relação entre a dinâmica social brasileira e a desvalorização da herança africana. Para fundamentar essa ideia, o filósofo Ailton Krenak afirma que, no Brasil, existem dois grupos — a humanidade, formada pela elite econômica, e a subumanidade, a qual tem seus direitos negados e é constituída principalmente pelas populações marginalizadas socialmente, como os povos originários e os negros. Por conseguinte, entende-se que o apagamento da cultura africana é uma extensão do panorama da desigualdade social brasileira, já que essa desvalorização sistemática silencia as vozes de populações que são violentadas e oprimidas há séculos, o que favorece a manutensão dessas pessoas no grupo da subumanidade. Dessa forma, o Estado deve desenvolver medidas que visem valorizar e apoiar artistas e escritores relacionados à herança africana no Brasil.
Sob outra ótica, a compreensão acerca da importância da ancestralidade na formação da autoimagem e da noção de pertencimento de cada indivíduo é imperativa. Para isso, a filósofa brasileira Marilena Chaui defende a ideia de que, enquanto os animais são seres naturais, os humanos são culturais – ou seja, a cultura em que cada pessoa está inserida compõe a essência desse ser. A partir disso, compreende-se que o silenciamento da herança africana nega a uma grande parte do povo brasileiro a sua própria essência, o que constitui uma violência estrutural e resulta numa noção de não pertencimento generalizada e em uma autoimagem defasada. Frente a isso, o Estado deve agir em prol da promoção de manifestações culturais afro-brasileiras.
Em suma, conclui-se que a desvalorização da cultura africana está diretamente relacionada a um processo sistemático de silenciamento de grupos oprimidos e resulta na falta de pertencimento de muitos indivíduos. Portanto, cabe ao Estado, por meio de uma parceria entre o Ministério da Economia (ME) e o Ministério da Educação e da Cultura (MEC), desenvolver manifestações culturais afro-brasileiras nas escolas, como, por exemplo, peças teatrais e festivais de dança, música e arte, assim como investir financeiramente na promoção de artistas e escritores que têm suas carreiras relacionadas à herança africana. Por fim, essas ações serão responsáveis por impedir o perpetuamento da desvalorização da cultura africana no Brasil.
✏️ Marina Vieira Almeida Lima, de Maceió (AL)
Redação nota mil de Marina Vieira Almeida Lima, no Enem 2024.
Reprodução
Na obra literária “Raízes do Brasil”, escrita pelo sociólogo Sérgio Buarque de Holanda, há a representação da miscigenação brasileira, caracterizada pela predominância da etnia africana na formação populacional do país. Contudo, apesar da indiscutível relevância da cultura advinda dos negros para a construção cultural da nação, a herança dos povos africanos não é devidamente valorizada, visto que suas contribuições culturais são omitidas no meio social. Logo, perante esse entrave, cabe a análise da estagnação estatal e da negligência educacional.
Diante dessa panorama, é perceptível a fragilidade governamental em valorizar a herança proveniente da África no Brasil. Nesse viés, a partir de 1888m dada a promulgação da Lei Áurea – responsável pela abolição da escravatura -, os escravizados africanos e seus descendentes tornaram-se marginalizados socialmente, em virtude da ausência de ressarcimento dos seus direitos civis por parte do governo. Sendo assim, como reflexo desse fato histórico, o Estado ainda negligencia a cultura afrodescendente ao não proporcionar políticas públicas eficazes, uma vez que não impulsiona a inserção de manifestações culturais africanas, como as danças tradicionais no ambiente social – a exemplo da falta da disseminação de festivais africanos pelo território -, em virtude da priorização da destinação de verbas a eventos de culturas privilegiadas, como a europeia. Por conseguinte, as práticas culturais dos afrodescendentes são invisibilizadas, tornando-as vítimas de discriminação, como o racismo, anulando suas identidades étnicas. Em suma, a omissão estatal é um fator agravante da problemática retratada.
Outrossim, é notório o impacto da ineficiência educacional em relação à desvalorização da herança dos negros na nação verde-amarela. Nesse contexto, o político Nelson Mandela ressalta o valor da educação e o seu potencial de salvar a humanidade. Entretanto, a educação brasileira apresenta uma série de lacunas que dificultam a promoção da herança africana no país. Prova dessa conjuntura é a escassez de disciplinas que abordem a história da cultura afrodescendente no Brasil — sem ilustrar apenas o período da escravidão —, devido ao destaque dado a matérias consideradas mais importantes, como a matemática. Consequentemente, as manifestações culturais africanas são negligenciadas são negligenciadas pelos estudantes, por adquirirem uma visão estereotipada de suas práticas e desconsiderarem sua diversidade. Em síntese, a lacuna educacional corrobora a temática mostrada.
Portanto, medidas necessitam ser tomadas para mitigar os desafios supracitados. Assim, é dever do Ministério da Cultura — órgão responsável por administrar a preservação cultural brasileira — incentivar a exposição da cultura africana, mediante eventos culturais. De igual modo, cabe ao Ministério da Educação, órgão responsável por assegurar a educação nacional, inserir os estudos africanos na grade curricular, mediante a criação de uma matéria para isso. Nesse sentido, com o intuito de valorizar a herança africana, suas práticas serão respeitadas.
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